Tudo indica que o ciclo
de vultosos investimentos em habitação popular está findando no Brasil. Uma das
razões, óbvia, é a forte contração no orçamento, decorrente da crise econômica,
cujos efeitos já começam a ficar visíveis; outra razão é que os parcos recursos
disponíveis serão compartilhados com projetos voltados para a população de
renda média, que não era tão priorizada nos governos petistas. Quem tem
condições de financiar imóveis mais caros também vai passar a contar com mais apoio
oficial na captação de crédito.
É provável que, nos
próximos anos, o déficit habitacional volte a crescer; que o número de
habitações precárias também se amplie; e que alguns avanços conquistados nos últimos
anos se diluam. Afinal, está aí em vigor uma emenda constitucional que limita
os gastos públicos. E isso, quase sempre, é sinônimo de gastar pouco – ou nada
– com pobre.
Feira de Santana foi
dos municípios brasileiros mais beneficiados pelos investimentos do Minha Casa
Minha Vida (MCMV). Cerca de 20 mil moradias foram construídas ao longo da
última década, de acordo com números oficiais. As inaugurações, inclusive,
começaram por aqui, em 2010, quando Dilma Rousseff (PT) disputava seu primeiro
mandato.
Talvez seja o momento
de começar a fazer um balanço do impacto desse programa sobre a vida da cidade.
Afinal, o ciclo findou; e milhares de feirenses ocupam, há alguns anos já,
vários desses condomínios. É a partir da compreensão dessa realidade que se poderá,
lá adiante, recomeçar um novo ciclo, quando o País reingressar numa era mais
arejada.
Periferia
Uma constatação
fundamental é que, na cidade, muita gente foi de fato beneficiada pelo
programa. São os pobres que moravam em habitações precárias ou que arcavam com
alugueis incompatíveis com seus rendimentos; ou, ainda, que compartilhavam
habitações com outras famílias, com gente demais em espaços exíguos. Esses, sem
dúvida, foram favorecidos, sobretudo em função do valor simbólico pago pelo
imóvel onde residem.
Os problemas, no
entanto, foram se tornando visíveis ao longo dos anos. Houve contemplado
colocando o imóvel à venda e, apenas algum tempo depois da inauguração, já
havia reclamações referentes a pisos cedendo, esgotos entupidos, rachaduras e
infiltrações. Notícias do gênero foram se acumulando ao longo dos anos na
imprensa. Mas, dado o clima festivo da época, pouca importância se dava às
reclamações da população pobre.
A violência nesses
novos residenciais também ganhou as manchetes rapidamente. Nas cercanias ou na
própria área dos conjuntos, moradores são assassinados com espantosa
frequência. Normalmente, jovens negros, supostamente envolvidos com o tráfico
de drogas. As ocorrências figuram nas estatísticas, clama-se por mais
segurança, mas o caso logo cai no esquecimento, até o surgimento de novo
episódio.
Habitações precárias e
entorno violento são características comuns dos bolsões de pobreza. O que
espanta, porém, é a velocidade impressionante da deterioração desses ambientes.
Talvez uma hipótese singela ilumine o caminho: como essas pessoas ganharam apenas
um teto – e todas as demais dimensões de suas vidas seguem precárias – é
natural que as mesmas dificuldades sejam transpostas para seus novos lares,
acompanhando-as.
Obviamente, esse
texto não tem a pretensão de esgotar o tema. Sequer de listar, sumariamente,
todas as dificuldades. A questão é complexa e exige interpretações bem mais
abrangentes.
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