O
clima mudou ao longo do último mês. Aquele calor implacável dos primeiros meses
do ano, quando as chuvas foram raríssimas – praticamente não choveu entre
janeiro e março – cedeu lugar a alguns dias com chuva intensa e, depois, aos
frequentes serenos que ajudam a umedecer o solo, preparando-o para o plantio.
Mesmo modestas, as precipitações mudaram o ânimo do trabalhador rural. Tem
gente confiante nalguma colheita mais adiante.
Esse
humor pode ser aferido ali no Centro de Abastecimento. Antes, os tabaréus
andavam cabisbaixos, falavam pouco e gastavam menos ainda. Aqui ou ali, puxavam
uma conversa breve sobre a falta de chuva, lamentavam o dinheiro curto, as
safras e os rebanhos perdidos. E seguiam adiante, sob o sol inclemente.
O
mês de chuvas ocasionais mudou um pouco o cenário. Já há quem gaste com o
lanche nas padarias do entreposto, alguns compram ferramentas, outros levam a
ração para os animais. Pelas conversas, o chão está úmido, adequado para o
plantio. “Só não tem água de reserva”, lamentam, já que as trovoadas aguardadas
com expectativa não vieram em meados do ano passado.
Comerciantes
do entreposto notam uma suave melhora nas vendas. E comemoram. É claro que a
seca – embora terrível – é apenas parte do catastrófico cenário econômico que predomina
no país nos últimos anos. Há, sobretudo, a profunda crise econômica que se
arrasta há quase três anos e que aflige, justamente, os mais pobres, público
mais habitual do Centro de Abastecimento.
Safra
Caso
persistam, as chuvas tendem a garantir a colheita do milho e do feijão a partir
de agosto. Isso significa um dinheiro adicional no bolso do trabalhador rural,
que aguarda ansioso a persistência do chamado “inverno”. Esse recurso vai se
traduzir em consumo, que vai ajudar a dinamizar o comércio feirense, sobretudo
aquele vinculado aos pequenos negócios, justamente o que mais sofre com a
severa recessão.
Por
enquanto, o que há são esperanças; inicialmente muito tênues, mas que depois
foram ganhando dimensão, justificando o otimismo florescente; caso a temporada
chuvosa se estenda um pouco mais, vai haver alguma fartura, quem sabe se ensaie
uma incipiente recuperação dos danos causados pela longa estiagem.
Isso
aí, porém, já foge do âmbito meramente climatológico. Surge a necessidade de
políticas que deem suporte ao produtor: crédito, insumos, capacitação,
infraestrutura produtiva e acesso a mercados. Mas isso é política de Estado,
projeto de longo prazo que vem faltando ao Brasil – sobretudo ao semiárido – há
muito tempo. Ultimamente, esse debate avançou pouco em função das políticas de
transferência de renda, transformadas em panaceia.
E, desde o ano passado,
francamente retrocedeu: virtuoso no Brasil, hoje, é cortar gastos, enxugar,
encolher, reduzir o orçamento àquele mínimo indispensável para sobrar o
suficiente para acelerar a ciranda do capital financeiro. É o que se percebe
nas entrelinhas do noticiário todos os dias. Os olhos de muitos dos tabaréus
que frequentam o Centro de Abastecimento e acompanham o noticiário nas tevês
parecem refletir essa percepção e suas terríveis consequências...
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