Aproxima-se,
na Feira de Santana, mais uma Micareta. Essa vem com algumas singularidades: há
pelo menos umas três décadas a folia não acontecia tão tardiamente, já nos
estertores do mês de maio, quando tradicionalmente o feirense já está
inteiramente envolvido com o forró que caracteriza as festas juninas. As obras do
BRT em andamento no circuito momesco certamente contribuíram para retardar o evento.
Dessa forma, a temporada de forró que se estende de meados de abril até o
início de julho vai ser significativamente encurtada.
A
crise econômica, que reformatou à força o Carnaval de Salvador, também induziu
mudanças por aqui. Lá, muitos blocos e camarotes tradicionais desistiram de
participar: com desemprego em alta e renda em baixa, o folião se retraiu e a
demanda despencou. Com prejuízos à vista, foi melhor tirar o bloco da rua,
subvertendo os versos da canção clássica de Sérgio Sampaio.
Com
isso, o discurso da festa para o folião pipoca ganhou fôlego: subitamente, os
governantes redescobriram o povão e dedicaram a folia a ele. Vá lá que,
eventualmente, alguns artistas tocavam em trios sem cordas nos últimos anos.
Mas, com a crise, a tendência se acentuou. E o folião pipoca, antes comprimido
pelas cordas e as estruturas dos camarotes, ganhou relevância na folia.
Em
Feira de Santana o movimento foi similar: os grandes blocos, aqueles que todos
os anos traziam as principais atrações, desistiram de desfilar. A justificativa
foi a mesma: a crise econômica. E cá, como lá em Salvador, entrou a prefeitura
para contratar as chamadas grandes atrações que vão fazer o feirense rebolar.
Estatização
Alguns
podem até negar mas, na prática, as prefeituras estão estatizando a folia
momesca nesse momento de crise intensa. Em Salvador ainda cabe o discurso da
atração de turistas, da visibilidade, ou coisa que o valha. Aqui na Feira de
Santana, nem isso: o público que acorre de fora é ínfimo. Não dá para afirmar
que a Micareta constitui uma das principais fontes de geração de riqueza no
município.
Ironicamente,
esse movimento de estatização ocorre justamente quando uma espécie de
liberalismo vulgar está muito em moda no Brasil. Por princípio filosófico e
convicção religiosa, todos defendem as privatizações, as concessões, as
terceirizações e tudo aquilo que signifique enxugar o Estado e fortalecer a
iniciativa privada. A Micareta, curiosamente, caminha na direção contrária, com
mais participação do poder público.
Pode-se
argumentar que, ultimamente, as folias momescas excludentes, com cordas
oprimindo o cidadão que tenta se divertir com sua latinha de cerveja na mão,
estão caindo em desuso, que a onda é democratizar. Pode até ser. Mas isso,
indiscutivelmente, só está acontecendo porque o modelo privado mergulhou em
crise profunda na Bahia.
Tomara que a crise e a
subversão no modelo de financiamento da festa – com mais governo e menos
iniciativa privada – pelo menos estimule novos olhares sobre a tradicional
Micareta feirense. E que a e festa se reinvente e se renove, reconquistando
corações e mentes que, no período, preferem viajar.
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