Quem
se orienta pelas noções do Bem e do Mal, pela eterna dicotomia entre bandidos e
mocinhos, certamente tem andado desnorteado com o noticiário político dos
últimos anos. Essa visão maniqueísta prevaleceu no ano e pouco que antecedeu a
derrocada no petismo, até o impeachment
de Dilma Rousseff (PT). Pintava-se um cenário de horrores: o petismo pretendia
implantar o comunismo no Brasil e gente do calibre de Aécio Neves (PSDB-MG),
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Michel Temer (PMDB-SP) – calculem – é que lideraria a
cruzada cristã e moralizadora.
Passado
um ano, exuma-se o desastre: Eduardo Cunha puxa cadeia no Paraná; Michel Temer
baqueia pilhado em gravações altamente comprometedoras; e Aécio Neves, despido
da aura moralizadora, verga sob uma lista de inquéritos estacionados no Supremo
Tribunal Federal. Já a retórica do anticomunismo se mostrou um esperto pretexto
para revogar direitos elementares dos trabalhadores e dos pobres. Foi o que se
viu ontem, com a revogação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), na
prática.
Em
Brasília, no parlamento, contracenam investigados, condenados, acusados e mais
uma variada fauna de gente altamente suspeita. A turba que exultava no plenário
com a defenestração do petismo se fragmentou: uns pelejam pela permanência de
Michel Temer, o mandatário de Tietê, na presidência e – suprema ironia – falam
em “golpe” ou “conspiração”; outros, mais argutos, farejam a derrocada
emedebista e ensaiam novo salto, com a algazarra habitual.
Mercadeja-se
sem pudor: apesar da retórica da austeridade, o balcão funciona freneticamente.
Liberam-se emendas, soltam-se recursos para obras, ofertam-se cargos para
apadrinhados, promete-se trânsito facilitado com quem maneja a chave do cofre;
quem diverge, expõe-se ao risco da retaliação sem pudores. Há quem ameace até via
imprensa, sem aquela cautela do passado.
Apesar
da franca ofensiva, o mandatário de Tietê vai perdendo terreno para Rodrigo
Maia, o festejado presidente da Câmara dos Deputados. Ele figura nas listas de
propina da Odebrecht com o codinome “Botafogo”. Torcedor do clube carioca, é
cotado para a presidência da República numa cada vez mais provável eleição
indireta. Segundo o noticiário, já conta com as bênçãos do mercado financeiro
para ascender.
Pisam-lhe
nos calos, porém. Um desses antagonistas é o governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin, que aspira a presidência da República em 2018. Teme que, aboletado no
cargo, “Botafogo” lhe atropele, recandidatando-se ao posto ano que vem; daí o
esforço para sustentar o mandatário de Tietê em Brasília, mesmo que essa
permanência aprofunde o infortúnio que assola o País desde 2014.
Transitando
pela oposição, o petismo – leia-se Lula – pouco se empenha para frear a
avalanche de retrocessos que vai se abatendo sobre os brasileiros desde o ano
passado. Talvez até para, no momento oportuno, fazer o contraponto conveniente,
colocando-se como crítico, embora, na prática, não pretenda revogar nada.
Exatamente como se fez quando venceu as eleições em 2002, com a afamada “Carta
ao Povo Brasileiro” que acalmou os banqueiros.
Enfim, na batalha que se
desenrola sobre a poeira vermelha do Planalto Central, não existe espaço para
mocinhos, nem para boas intenções, menos ainda para o Bem que se contrapõe ao
Mal e que, no fim, prevalece.
Comentários
Postar um comentário